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O eu e o outro

Leone Rocha - Macapá, AP

O eu e o outro

Ele procurava desesperadamente ser, mas a cada encontro com o Outro percebia que este, da mesma forma, queria ser também. E esse Outro negava sua existência pela diferença implícita entre ambos que se revelava numa negação mútua de existências. Cansado de tentativas vãs, de tantos impedimentos e obstáculos, pensou em um plano. Fez hora extra no trabalho de garçom durante seis meses, o suficiente para custear a matrícula em um curso de sobrevivência na floresta, compra de equipamentos e dos livros que ainda não lera. Decorridos mais seis meses, arrumou a barraca, juntou todos os livros que conseguiu, comunicou a família e rumou para o isolamento na selva à beira do rio.

Um ano transcorreu. Ele dominava história da filosofia, da arte, da música. Falava a língua dos homens e dos anjos, mas ainda sentia-se vazio. Não escutava comentários, não havia a quem comentar. Tudo corria do seu jeito e não sabia se acontecia do melhor jeito por que não havia segunda opinião. Cansou-se novamente e, pasmo, percebeu que sentia falta do Outro.

“E agora, como vou ser? Estou em uma sinuca de bico!” Foi então que ele viu algo na floresta. Estava chovendo e o local onde ele se encontrava estava alagado. Existiam um grupo de formigas próximo. Elas estavam reunidas, mudando de lugar, atravessando um trecho alagado, e faziam uma ponte coletiva para cada formiga passar. Ao final todas passaram. Ele percebeu que cada formiga se anulou por um bem maior que resultou no melhor para cada uma. Cada formiga cedeu um pouco, anulou-se um pouco para coexistirem em sociedade, para que todas pudessem ser.

Nosso amigo egoísta voltou para a cidade decidido a largar os melindres e buscar ser mais sociável.

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