A dúvida orgânica | por R. F. Raiol
- Silvio Carneiro
- 1 de mai.
- 2 min de leitura

De escritor para escritor: quem é você?
Não estou falando de fama (deixe eles olharem).
Não estou questionando se você tem currículo ou algum tipo de talento.
Quero saber: qual é a sua voz?
De escritor para leitor: você se importa comigo?
Não quero seu carinho (não agora).
Quero saber se você lê por prazer ou porque sente um vazio indescritível no peito — e precisa de mim para mijar em cima dos seus sonhos.
Desculpe por falar assim (eu controlo seu tempo?),
mas preciso te alertar: eu não sou real.
Sou fruto do seu desejo, escondido na sua imaginação (eles estão gostando),
esperando o momento certo para te agarrar e decidir por você.
Eu?
Sou apenas um cidadão aleatório com sangue antigo —
sangue de quem caça a carne e vende o couro.
Vivi até aqui, sobrevivi nessa ilha isolada,
apenas para existir dentro de você.
Deixa... deixa eles olharem.
Porque da próxima vez que você olhar nos olhos de alguém e abrir a boca para falar,
eu vou estar lá.
Quem?
(...)
Mais cedo, fazendo uma limpeza em casa,
notei que minha mãe não lavava seus potes de shampoo e cremes.
Ela tem um monte, vive comprando novos.
Fiquei pensando: por que ela não usa os que já tem até o fim?
E daí? Só estavam um pouco sujos...
Então me dei conta de uma coisa:
ela simplesmente não se importa —
e isso machucou meu coração (ela acabou de passar por mim, cantarolando),
porque o que eu mais quero é cuidar dela.
Vou te dar uma dica:
lembre-se de cuidar de quem cuida de você.
Cuide do seu pai.
Cuide do seu irmão.
Cuide do seu cão.
Cuide — e cuide para que suas ações atraiam as bênçãos
dAquele que verdadeiramente cuida de nós.
Rajadas de vento tentam atravessar meu corpo,
mas não conseguem.
Eu existo.
E não preciso pensar para estar aqui.
Faço isso por você.
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