
O que seria se nos pudesse ser dada a oportunidade de revisar a vida como se fosse um texto. Este mesmo, depois de publicado, foi revisado três vezes (até agora), porque faltavam ou excediam letras. Mas o que seria revisar as faltas ou excessos da vida?
À HORA
À hora do salto no vazio, eu retrocedo;
Sou covarde demais para me desapegar.
Não abro mão nem dos erros que cometi,
Penso que, sem eles, eu não seria eu.
Hoje, à beira da morte, lembro-me de a ter encontrado no trilho de trem em que caminhei bêbado,
Nas ruas sombrias em que passei absorto,
Nos amores que não pude amar
O tanto que prometi,
Nos amores que quis amar para sempre
Sem jamais ser amado por eles.
Joana só me quis bem,
E eu só lhe fiz mal.
Rita morreu sem saber que eu a amava,
Diana casou-se com um fraco
Para provar que sou mais fraco ainda.
Anita me aparece nos sonhos
Para se rir do tempo que passa para mim,
Mas para ela(s) não.
Desespero-me com a confusão de nomes em rima,
Não sei se Anita, Diana, Rita, Joana
São só rimas confusas
Ou sopa de letras de amores
Que jamais tive.
Acho que os amores já se perderam no retrovisor,
Abro algum livro sagrado
Para querer conformar-me com o Tudo,
Como um bicho à iminência da morte,
Como um moinho sem vento.
Como hipócrita, busco um deus
Que criei do egoísmo
E exijo dele alguma salvação
Que não sei dizer de quê,
Que não sei dizer para quê,
Que não sei por que querer.
À hora de balançar o banco sob os pés,
Eu afrouxo o nó e livro o pescoço do laço.
Sou covarde demais para esbanjar a vida.
Penso que ainda há muitos erros a me esperar,
Muitas dores para gemer,
Muitos amores para perder,
Muitas perdas para chorar…
Mas…
Pode ser que não seja nada disso.
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